sexta-feira, 14 de novembro de 2014

Entrevista com Incarceration | Death Metal brasileiro destruindo na Europa

Daniel Duracell, Björn Freese, Michael "Micha" Koch (Foto by Melanie "FreakyD.com")


O Incarceration surgiu em Manaus no ano 2010. Até então como uma 'one man ban' formada por Daniel "Duracell" Silva. Em 2011 o deathmaníaco se mudou para a Alemanha e lá firmou a formação do grupo como um power trio. Desde então o Incarceration vem destruindo tudo pela Europa com seu Death Metal rápido e desgraçado. Conversamos com Duracell, que nos falou sobre estabilização do grupo, turnês no velho continente e uma possível vinda ao Brasil. Confiram!

por Jaime “Netão” Guimarães


1 – Saudações, Duracell! Incarceration é uma banda com dupla nacionalidade, que teve seu início no Brasil. Como foi a mudança para a Alemanha e formação e estabilização do restante do grupo? Foi difícil se adaptar ao novo país?  Como foi o contato com Michael e Björn?

Duracell: Fala Jaime, beleza? Obrigado pela entrevista e parabéns pelo Under the Ground! Então, o Incarceration teve início em 2010 enquanto eu ainda morava em Manaus. Na época era apenas um projeto solo meu, paralelo às atividades da minha outra banda, o Mortificy. Em 2011 me mudei pra Alemanha (devido à minha mulher que é alemã), e precisava 'tocar'. Sobre a adaptação o mais difícil foi o idioma - aprender alemão de fato não foi fácil -, mas após um ano estudando isso foi superado. Nesse meio tempo segui compondo novos sons, e sempre que ia aos shows em Hamburgo eu perguntava dos bangers pelo baixista e baterista mais fudidos da cena. Passado algum tempo me apresentaram o Björn e um tempo depois o Micha. Eles curtiram o material que eu já tinha gravado sozinho daí marcamos um ensaio. Neste primeiro encontro tocamos várias vezes o som 'Sacrifice' e foi bem animal. Tocamos, batemos cabeça fudidamente, e naquele momento ficou bem claro que o Incarceration estava completo.

 Daniel Duracell in Koblenz (Foto by Bettina Mayer)


2 – Como é o processo de composição da banda? Todos os membros participam? Ouvindo o som fica claro que a influência direta é o Old Death Metal, rápido e desgraçado; mas, além de bandas, o que mais está presente na base do Incarceration? Seja musical ou liricamente.

Duracell: O Incarceration começou como projeto solo meu, nessa época cheguei até a gravar um som completamente sozinho. Nisso, acabei desenvolvendo uma independência muito grande em todo o processo de composição. Até o presente momento isso não mudou muito: continuo compondo sozinho. Até agora todos os riffs e letras são meus, exceto por uma letra que o Micha escreveu e que possivelmente vai figurar no nosso Debut Album. Ele é muito talentoso e acredito que no próximo álbum teremos mais contribuições suas. Sobre nossas influências temos uma gama gigante, mas em resumo somos inspirados pelos riffs mais rápidos de bandas fudidas como velho Slayer, Sepultura, Repulsion, Sadistic Intent, Repugnant, Entombed, Kaamos, Verminous, Merciless, Malevolent Creation, Morbid Angel, Ratos de Porão, Sadus, Dark Angel, entre mais uma porrada de bandas. Sobre a parte lírica, tem certeza que você quer saber sobre isso (risos)? Talvez seja um papo meio baixo astral, mas vamos lá! Liricamente abordo muito as condições existenciais humanas. Antes de sair do Brasil me formei em psicologia, estudei alguns períodos de filosofia também e com isso nutri um interesse grande pelo existencialismo. É impossível existir sem sofrer, sem sentir medo, raiva, angústia, ódio, e sem morrer no final, concorda? E mais: vivemos 'pequenas mortes' a todo instante: um relacionamento que termina, um momento que fica pra trás, estamos cercados de diversas mortes, de diversos 'fins' no nosso cotidiano. Ao mesmo tempo, nessa caminhada rumo ao fim das nossas vidas, temos que fazer, a todo instante, várias escolhas. Vivemos em um labirinto, onde a cada instante temos que tomar decisões das mais simples às mais complexas. Quem está lendo estas palavras nesse momento escolheu fazer isso, mas poderia estar fazendo qualquer outra coisa. Essa escolha implica ao mesmo tempo em sacrificar uma infinidade de outras escolhas. Estamos todos encarcerados (daí o nome Incarceration), condenados à essa liberdade/obrigação de escolher como caminhar em nossos labirintos da existência, enquanto o tempo segue cada vez mais rápido nos empurrando para os nossos abismos pessoais. Nessa caminhada temos ainda a companhia de vários demônios que habitam dentro de nós, sedentos e sempre buscando se libertar. Nossos desejos, anseios, nossas vontades - muitas delas bem perversas, mundanas e profanas. Isso gera conflito e no meu caso eu transformo esse conflito em Death Metal. Então é sobre esses conflitos e sobre essa forma peculiar de entender o humano que berro no Incarceration: sofrimento, caos, desgraças, perversidade, profanação, demônios e morte. Mas isso é algo bem pessoal meu mesmo e não quero continuar alugando vocês com esse papo não, bora voltar a falar de som aê! (risos)


3 – Vocês lançaram até agora dois materiais: o split Decrepit Aberration(2012), lançado de forma digital junto com o Escarnium(!) do Brasil, e o EP Sacrifice(2013), este lançado em forma de K7, CD e LP, por alguns selos. Como tem sido a circulação desse material? Qual o suporte dado pelos diversos selos que lançaram o Incarceration?

Duracell: Escarnium é uma banda que tem uma influência gigante na história do Incarceration, e esse split foi uma forma simbólica da gente registrar essa irmandade. É o único registro com o Incarceration da época 'one man band'. Não chegou a sair em formato físico, nós fizemos arte de encarte, capa e tudo mas a distribuição é apenas online mesmo. Quem procurar acha fácil pra baixar. Sobre o EP Sacrifice felizmente tem rolado muito bem. Saiu em tape, vinil e CD, e está tudo esgotado. As tapes esgotaram em questão de dias, e o vinil/CD esgotaram em menos de um ano após o lançamento. Ainda tem umas últimas cópias circulando em algumas distros underground, mas tem que garimpar um pouco. Quem lançou foi a FDA Rekotz (Alemanha), Dawnbreed Records (Holanda) e Misanthropic (Brasil). Esses três selos deram uma força sem tamanho, acreditaram no Incarceration enquanto ninguém nunca tinha ouvido falar da gente. Pra gente significa muito e agradecemos muito aos selos e a todos que cataram qualquer material.




4 –  Há também o clipe da faixa Forsaken and Forgotten, presente do EP. A produção ficou simples, mas muito bem realizada. É um belo “cartão de apresentação”. Quem foi o diretor? Ficaram satisfeitos com o produto? O que acha do audiovisual enquanto ferramenta para promoção de uma banda?

Duracell: Por acaso um dia eu conheci um estudante de cinema muito gente boa chamado Mike. Ele disse que tinha uma câmera bacana e daí dei a ideia do clipe, ele curtiu e fizemos. O clipe foi gravado no nosso estúdio de ensaio mesmo (na Europa as bandas se juntam, alugam uma sala, colocam os próprios ‘equipos’ lá e ensaiam). Foi bem simples: nós tocamos Forsaken and Forgotten umas 10 vezes, e a cada vez ele fazia filmagem de um ângulo diferente. No final ele pegou os takes que ele curtiu mais, editou e já era. Nós curtimos bastante o resultado final sim. A gente curte muito convidar amigos pros nossos ensaios, às vezes até organizamos shows privados no nosso estúdio. Com esse clipe nós pudemos mostrar a todos um pouco de como é isso. Nosso espaço, e como funcionamos quando fazemos som juntos. Isso ajudou bastante na divulgação da banda também, definitivamente. Enquanto não podemos fazer um show no Brasil, por exemplo, pelo menos tem como os bangers verem esse vídeo (e os outros que tão rolando) e ficarem mais na pilha pra ver a gente em ação. (risos) \m/





5 – Em 2013 ocorreu uma turnê na Europa, também com o Escarnium. Como foi a experiência de excursionar por 7 países diferentes? A recepção aos shows foi boa?

Duracell: Essa tour foi massa demais. Um monte de filho da puta viajando e tocando em todo canto, não tem como não ser divertido(risos). Tocamos pela Alemanha, Holanda, Bélgica, Itália, República Tcheca, França e Suíça. Quando planejamos essa tour eu ainda não conhecia o Björn nem o Micha, então o plano era o Incarceration tocar com o line-up brasileiro (eu, Victor Escarnium e Nestor Carrera). Quando chegou a Tour, o line-up alemão já estava afiado então alguns shows rolaram com os alemães e outros com o brazucas. O primeiro show com os brasileiros foi em Milão na Itália. Eu nunca tinha sequer ensaiado com o Victor nem com Nestor. Subimos no palco, daí avisei o público 'pessoal, nunca ensaiamos e estamos aqui no palco, se rolar rateada não liguem'. Pra minha surpresa quando começamos a tocar foi fudidaço e o pessoal pirou demais! Nestor e Victor são músicos muito talentosos além de grandes pessoas. Só temos ótimas lembranças dessa tour, temos que repetir isso aí. Talvez no Brasil?  \m/


6 – Um debut album está sendo composto. A quantas anda o processo para o disco, já tem selos interessados no lançamento? Há também a preparação para mais uma tour europeia, desta vez ao lado do Unaussprechlichen Kulten(CHI) e Zombiefication(MEX), o debut já estará disponível até lá?

Duracell: Já estamos finalizando as composições e felizmente tem selos confirmados pro lançamento, sim. Vai ser um play desgraçado, quem curtiu o EP Sacrifice vai pirar no Debut com certeza. Adianto alguns títulos: Infernal Suffering, Obsessed by Death, Chaos and Blasphemy, Devouring Darkness, entre outros. Só veneno. Estamos planejando gravar e lançar isso no ano que vem (2015).  A tour com Unaussprechlichen Kulten e Zombiefication rolou agora em setembro e foi fudidona, muito show animal. Agora o Incarceration está mais sólido na cena europeia, e participamos de uns festivais bem  bacanas como o Kill Town Deathfest e o Party San Open Air. Esse ano dividimos palco com Repulsion(!!), Dead Congregation, Malevolent Creation, Grave, Suffocation, Napalm Death, Obituary, God Macabre, Sonne Adam, Anatomia, Undergang, Nunslaughter, Kreator, Morbus Chron e muitas outras bandas.


Kill Town Deathfest 2014

Party San 2014

7 – Além do Incarceration, você gerencia em parceria com Vladimir Sužnjević a Roadmaster Booking, uma agência de turnês que já levou algumas bandas para a Europa, como a já citada Escarnium, Headhunter D.C e Violator, entre outras. Sei que você já tem longa experiência em turnês. Como foi pensada a Roadmaster? E, de forma simplificada, como funciona a empresa?

Duracell: Antes da Roadmaster eu já tinha feito algumas turnês pelo Brasil com o Mortificy (minha banda dos tempos de Manaus), além de ter acompanhado o Violator em 2007 na parte estrangeira da Tour Sulamericana deles (Venezuela, Colômbia, Equador, Bolívia, Peru, Argentina, Chile, Paraguai). Em 2010 os Violas me convidaram pra acompanhá-los na tour europeia, e coincidentemente o motorista da tour era o Vlad. Quando voltei pro Brasil após a tour, várias bandas entraram em contato comigo perguntando sobre como fazer tour na Europa, e pedindo meu help pra fazer isso acontecer. Uma dessas bandas foi o Escarnium. Juntamente com os planos de me mudar pra Europa, vi nisso uma oportunidade de trabalhar com algo que curto muito e que já tinha muita experiência por conta das turnês anteriores. Então criei a Roadmaster pra oficializar minha prestação de serviços nessa área. Agora já nos desenvolvemos bastante, trouxemos pra Europa inúmeras bandas brasileiras (como você bem citou), e estamos trabalhando com várias bandas gringas também como Centurian, Skeletal Remains, Evil Invaders, e acabamos de fechar com o Hirax pra uma tour em 2015. Antes nós organizávamos tours de bandas que queriam divulgar seu trabalho na Europa, mas agora estamos fazendo melhor: estamos abrindo a possibilidade pra essas bandas tocarem pela Europa juntamente com grandes artistas (como o Hirax e Centurian, por exemplo). Organizar turnês na Europa é um projeto complexo, audacioso e que demanda muita responsabilidade. Mas basicamente nós fazemos o melhor possível pra oferecer uma solução completa: agendamento de shows, divulgação, aluguel de van, aluguel de equipamentos de som, etc. Bandas interessadas em excursionar na Europa juntamente com bandas renomadas na cena, fiquem à vontade pra fazer contato, são muito bem vindas. \m/


8 – Muitos podem pensar que uma turnê na Europa é fácil, mas há aí uma série de fatores, shows que podem ser cancelados, desgaste de membros, etc. O que uma banda precisa hoje para fazer uma turnê? Há grandes dificuldades?

Duracell: se for muito bem organizada é um pouco mais fácil sim, mas mesmo assim é bem cansativa. Tem que querer muito e ser muito apaixonado pra não ser vencido pelo cansaço, desgastes, etc. Hoje está bem mais fácil que antes pra fazer uma turnê na Europa. Há muito mais informação, comunicação, além de profissionais especializados em trabalhar com isso e oferecer esse serviço pra bandas, como eu. A maior dificuldade, ainda acredito que sejam os custos (principalmente com logística: passagens de avião pra Europa, aluguel de Van, combustível, taxas rodoviárias, etc), e o excesso de shows grandes que rolam aqui (que acabam diminuindo o público de bandas desconhecidas na Europa). Só pra dar um pequeno exemplo, terça-feira(11/11) em Hamburgo rolou Whipstriker/Apocalyptic Raids/Farscape, quarta rolou Overkill, ontem rolou Saxon e hoje a noite vai rolar Convulse/Undergang. Isso pra citar alguns dos shows. Paralelo à isso rolaram vários outros shows de 'rock' em outros clubes da cidade. Então se chega uma banda 'desconhecida' na Europa, por mais talentosa que a banda seja, infelizmente muitas vezes não vai tocar pra grandes públicos, pois se tem com muita frequência shows grandes aqui. Não tem como ter muito público em todos os shows. Por conta disso estamos trabalhando com bandas cada vez maiores e oferecendo a oportunidade pra bandas de qualquer país viajarem como bandas de suporte. Assim, através da Roadmaster Booking uma banda que ainda não é conhecida aqui poderá, por exemplo, fazer uma turnê juntamente com o Hirax, tendo praticamente os mesmo custos que teria fazendo sozinha. Acreditamos que dessa forma os grupos podem desenvolver mais rapidamente suas carreiras na cena Europeia e possivelmente se tornarem bandas muito bem sucedidas por aqui, pois principalmente as bandas brasileiras tem um talento gigante que é muito apreciado na Europa.   





9 – Você está a alguns anos na Alemanha e vez por outra excursionando, seja para tocar ou agenciando as bandas. Poderia traçar um breve paralelo entre a cena no Brasil e no “velho continente”? Como se dá a estrutura de shows(casas, produtores, público)? As bandas conseguem fazer algum dinheiro como as apresentações? Dá pra viver de Metal por aí?

Duracell: A diferença é gigante, por vários fatores. Os clubes aqui geralmente organizam shows quase todos os dias, ou pelo menos recebem artistas internacionais todas as semanas. Então eles  tem um know-how muito maior do que aquelas casas que organizam um show a cada dois meses. No Brasil ainda rola muito de se organizar show em espaços que não tem rotina de receber artistas. Então geralmente não tem equipamentos de qualidade, não tem camarim pras bandas, profissionais de som. Aqui isso é diferente, muitos clubes tem até alojamentos onde as bandas podem dormir depois do show pra seguir suas viagens. Há uma circuito de turnês construído há décadas e muito sólido, então os clubes são bem adaptados à isso e quem ganha são as bandas. Outro fator: logística. As distâncias entre as cidades e países em uma turnê são bem menores: daqui de Hamburgo, em 5 horas de carro se chega na Holanda, Bélgica, Dinamarca, França, República Tcheca ou Polônia.  Ou seja, muitas vezes é possível organizar uma turnê de 15 shows, em que cada show fica a em média 3 a 5 horas de distância um do outro. Sobre grana, uma diferença grande está na venda de merchandising. Além do cachê dos shows, aqui se vende muito merchandising, o europeu tem mais poder aquisitivo e quando curte a banda ele compra mesmo as camisas, cd's, etc. Apesar disso, eu conheço muito poucos artistas que vivem do metal como músicos aqui. É perfeitamente possível cobrir os custos de uma banda com a venda de merch e cachês, e talvez sustentar algum membro, mas pra sustentar 4, 5 membros a banda precisa ter um nome muito sólido na Europa e tocar muito. Fazer turnês o tempo inteiro.

10 – Fica o agradecimento pelo tempo concedido e também o espaço para qualquer consideração. Continuem fazendo Death Metal cru e ligeiro! Avante!

Duracell: Netão, valeu você por dedicar teu tempo e suas energias pra fazer um material como este. Atitude admirável. Torço muito pra que você receba muito apoio, e que o reconhecimento por esse trabalho sirva de combustível pra você seguir produzindo. E que isso inspire mais bangers a fazer o mesmo, precisamos de mais iniciativas assim! Te prometo que por aqui continuaremos fazendo Death Metal cru e ligeiro sim, cada vez mais ligeiro (risos)! Pros leitores que acompanham o Incarceration e querem ver a gente em ação no Brasil, aviso que uma tour por aí está definitivamente nos nossos planos. Fiquem à vontade pra fazer contato com a gente, vocês são extremamente bem vindos. Espero em breve estar levando nossa devastação Death Metal pro Brasil pra gente bater cabeça juntos aí! Death Metal rules, uhhhh!!!!!!!!!


Contatos:
Faceook: www.facebook.com/incarceration
Site: www.incarcerationdeath.com

Email: incarcerationdeath@hotmail.com

666!

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