Por Jaime "Netão" Guimarães
Era bom demais pra ser
verdade: esta era uma das frases mais repetidas por headbangers de todo o Brasil
em abril de 2012, período em que aconteceu o fatídico e infame Metal Open Air
(MOA). Meses antes a euforia era imensa. Do nada surge o boato de que haveria
um grande festival no país. O que era boato começou a ganhar corpo, e bandas,
local, venda de ingressos, estrutura, logística, etc, foram anunciados. O povo
começou a creditar que o evento aconteceria mesmo e que seria um marco para o
Metal no Brasil. Tudo ficou a cargo das empresas Negri Concerts, de São Paulo,
e Lamparina Produções, do Maranhão, Estado onde foi realizado o festival.
Porra. Quem não queria que
aquilo desse certo? Obituary, Destruction Exodus, Anvil, Venom, Ratos de Porão,
Attomica, Exciter, Headhunter DC, e mais uma caralhada de bandas que todo mundo
gostaria de assistir, e o melhor, tudo num fest só, e no Brasil. Imagina!? Eu mesmo
cheguei a comprar meu passaporte, só não fui por motivo$ outro$.
Mas era bom demais pra ser
verdade...
Às vésperas da grande
celebração que seria o evento os problemas começaram a surgir, e pela internet
todos tinham pelo menos noção do que seria um grande perrengue. Falta de
organização, de segurança, de orientação; e o pior: falta de bandas. Diversos
grupos começaram a cancelar suas apresentações por falta de pagamento de
cachês, passagens e outros pormenores acordados. Algumas, a exemplo do
Obituary, chegaram a desembarcar no aeroporto de São Luiz, mas tiveram que
voltar, pois não havia nem suporte. Nada.
Resultado. O festival
aconteceu, mas com menos da metade das bandas vendidas em seus ingressos e
material promocional, e com muito menos ainda em serviços que eram prometidos
aos consumidores. Muitos ainda aproveitaram as apresentações que foram possíveis
de acontecer, mas a raiva por serem lesados permaneceu. Sem contar as horas e
horas gastas em ônibus vindos de longas distâncias, as dormidas em aeroporto,
os furtos dentro do local do evento... o caso foi até parar em rede nacional, e
os produtores (de merda) ficaram marcados como bandidos, tendo o posto de líder
o pilantra Felipe Negri.
Pois bem. Voltando pra 2014.
Esse ano foi anunciado um grande cast no Zoombie Ritual, um festival já firmado
no cenário metálico do Brasil, que está em sua sétima edição e acontece em Rio
Negrinho, Santa Catarina. Além de grandes nomes gringos, muitas clássicas
bandas nacionais foram anunciadas como integrantes da grade de shows do evento,
que acontecerá durante este fim de semana. Até aí, tudo bem. O Zoombie Ritual já
tem uma tradição, foi realizado por outras seis vezes, e sempre agradou o
público. Não é um MOA, que surgiu de uma hora para outra. O problema foi uma
onda de cancelamentos que se sucederam e acabaram por gerar polêmica quanto a
idoneidade da produção. Para citar alguns: Mpire of Evil, Onslaught, Stress,
Krisiun, Brujeria, Carcass, incantation, Whiplash, Ragnarok, etc.
O público do evento ficou
dividido. Uma parte acha que é comum que alguns
grupos cancelem em um festival desse porte; outra parcela ficou
indignada com a “falta de competência” dos produtores do festival e até
chegaram a cancelar sua ida. Muitos se dizem arrependidos por terem gasto
dinheiro com passagens, barracas, planejamento, e estão frustrados. E outros,
também, não deram tanta importância para as baixas no line-up e vão para os
quatro dias de Metal em Rio Negrinho. Demais eventos pelo país foram
prejudicados e tiveram que dar seus pulos para resolver os buracos em sua
programação, já que aproveitariam a vinda das bandas para fazer mais datas,
além do Zoombie. Teve até membro de banda, a exemplo o Onslaught, que ficou sabendo que não iria mais vir pelo facebook.
Já a gerência do ZR explicou
as faltas do cast tendo como argumentação problemas financeiros e pouca procura
por ingressos antecipados, cujo valor arrecadado seria utilizado para custear a
vinda dos grupos. Algumas outras bandas, como Salário Mínimo e Sex Trash,
desistiram por motivos alheios à produção do evento. Foi também dada opção de as pessoas que se sentirem lesadas
reaverem seu dinheiro de volta, e alguns outros grupos entraram para "tapar buraco".
É bom frisar que, apesar da
comparação, esse texto não visa acusar o ZR de agir da mesma forma que o MOA –
muito longe disso –, mas sim trazer uma reflexão acerca da realização de
grandes festivais, com enormes custos e logísticas complexas, sendo realizados
para o público underground do Brasil. Os brasileiros não são capazes de realizar
grandes eventos? Sim, são. Sou contra o discurso derrotista que prega o “ah,
isso é Brasil...”, pois isso põe todos em um mesmo “saco”, e é preciso
reconhecer que há muita gente ralando pra fazer bons eventos, com muitas bandas,
e o máximo de seriedade possível.
O problema é querer abraçar
o mundo com os braços. Falta de planejamento. Não se pode entrar em uma
empreitada deste porte e se confiar em venda de ingresso antecipado, isso é um
tiro no escuro. Não se pode chamar trocentas bandas gringas fodas e não ter a
garantia que poderá arcar com a vinda, estadia e pagamento de todas. Mesmo
agradando uma ala do público, outra ficará insatisfeita, e estes últimos farão
barulho na próxima edição, e muita gente ficará com pé atrás em futuros
eventos. É uma bolha estourando e sujando todo mundo.
Para além do nacional, fica
a imagem de que no Brasil não tem produtor responsável (e podem acreditar que
uma imagem suja é mais difícil de limpar do que o contrário). Recentemente
houve o caso do Toxic Holocaust, que cancelou parte de sua turnê na América do
Sul e acusou não cumprimento de alguns cachês e acordos em países vizinhos, o
que gerou um enorme problema e constrangimento entre a banda e os bangers que
queriam ver os shows, além de acusações de produtores brasileiros a outros sul-americanos
e vice-versa. E isso é só pra citar um caso, dentre vários.
Vejam bem. Imaginemos, por
um momento, que toda essa energia para fazer “o maior festival que o Brasil já
viu”, pra trazer “o maior cast que este país já presenciou”, fosse utilizada
para fazer um puta festival com muitas bandas nacionais e algumas gringas
possíveis, como acontece em algumas iniciativas louváveis aqui mesmo. Melhor,
se reduzissem, um pouco, a ambição e planejassem bem seus gastos e estratégias
de marketing, visando não depender do ovo no cu da galinha. Ninguém quer outro Metal Open Air. Imaginem!
Seria bom demais pra ser verdade?
666!
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